Fui uma criança criminosa
Fui uma criança criminosa. Aos 11 anos eu morava na Vila Macedo, Piraquara, ia ao colégio Paulo Leminski de ônibus, entretanto, ao invés de descer no ponto correto, descia somente no ponto final, Guadalupe. Eu e meu comparsa Paulinho.
No centro de Curitiba três eram as táticas, ele, dois anos mais velho, havia me ensinado:
1. Comer um x-tudo, ou qualquer outro lanche ‘caro’, pedir uma fanta uva, o néctar da infância, e, após comer, dar um “Cavalo Louco”, isto é, correr como se não houve o amanhã, sem olhar para trás até que a multidão voltasse a se lembrar que éramos invisíveis. (Crime de furto – pena- 1 a 5 anos).
2. Aproveitar que estávamos de uniforme de colégio, dizer que havíamos perdido o vale-transporte (na época da fichinha), e pedir para que as pessoas nos dessem dinheiro para voltarmos para casa, o que nos rendia o equivalente, hoje, a uns 10 reais. (Crime de estelionato – pena: 1 a 5 anos).
3. E a missão mais difícil era a de abrir o freezer de sorvete, colocar rapidamente um na manga, pegar o outro, levar até o dono do estabelecimento, perguntar “quanto custa esse, tio?” Devolver no freezer e se deliciar momentos depois com o recém lançado “Sorvete Mega”. (furto qualificado pela destreza do agente – pena: 2 a 8 anos)
Contudo, se em algum momento da minha infância e adolescência eu tivesse sido preso, meu destino seria outro. Degradado pelos efeito do cárcere eu seguiria minha paixão profana pelos delitos de pequena monta. Teria, com certeza, minha vida abreviada pela pesada arte da sobrevivência. Por isso sou contra a redução da maioridade penal, pois do contrário eu não estaria aqui.
Renato de Almeida Freitas Jr. — Advogado criminalista, mestrando em Direito pela UFPR.
Fonte: Brasilpost